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Vítima da moda, eu?


Sempre desprezei o amarelo. Achei que nunca compraria uma peça de roupa nesta cor e acabei comprando. Primeira semana de outono, dias mais amenos e estou tentada por uma bota. Branca. Bota branca, eu? Minha amiga de infância não acreditaria se me visse com uma. Nos prometemos nunca usar calçado branco. Aos tênis brancos aderi faz tempo, desculpa Carol.

Padrão de beleza x padrão de conduta

Esses exemplos ilustram que "nunca" é uma palavra que a moda ignora. O ciclo de aceitação de uma tendência pode até demorar, mas em algum momento ele chega até nós, meros mortais. Segundo alguns analistas, há uma curva em forma de sino que descreve a temporalidade da adoção da moda, desde o entusiasmo até o desinteresse. Esses períodos variam de alguns meses a dois anos, e se adaptam aos gostos, estilos e orçamentos de consumidores diferentes. 

Os motivos pelos quais compramos roupas variam de pessoa para pessoa e até de um dia para o outro. Um dos primeiros critérios tende a ser o preenchimento de necessidades mais básicas, como as mudanças de clima (ou da estação), a prática de esportes, o trabalho. Por sua vez, para além de questões pragmáticas como a utilidade, a funcionalidade e o poder aquisitivo, há algo de enigmático nas motivações dos consumidores. De acordo com o pesquisador Guillaume Erner (2004), se tivéssemos de hierarquizar nossas ações, começando pelas mais fáceis de argumentar até as mais difíceis de sustentar, a moda do vestuário viria em último lugar. Mais de um ano depois do boom do amarelo, lá está meu vestido ocre no armário. Ou seja, acabei aderindo à cor, antes rejeitada. 


A moda precisa de seguidores, do contrário, não existiria como mercado. Novas propostas começam a aparecer nos anúncios, nas vitrines, em todos os e-commerces e editoriais de moda. É uma construção. A gente se acostuma, cogita a possibilidade, começa a cobiçar e adere. Comigo, pelo menos, é assim que acontece. 

É possível formular outras hipóteses sobre como os modismos nos mobilizam. Ainda que haja a crença primeira numa espécie de conspiração imaginária, como se existisse uma "comissão" (fabricantes de tecido, estilistas, birôs, marcas famosas, blogueiras etc.) responsável por impor as tendências ao público, nossas escolhas ou compras não obedecem explicações lógicas. É evidente que algumas pessoas, empresas ou celebridades com visibilidade e alcance (chamados nos últimos anos de influenciadores) contribuem na formação dos nossos gostos ou predileções e podem, sim, instigar certos desejos. Mas não somos passivos diante dos apelos em circulação. 

O biquíni que vela e revela

O fato de eu adquirir uma sandália que várias blogueiras possuem estaria me inserindo nesse grupo específico de garotas inspiradoras, o que dá pistas do valor simbólico do consumo para a autorrealização social. Significa dizer que a gente não compra apenas sapatos ou peças de roupa, mas seus efeitos. Esses metaprodutos podem estar relacionados a uma estética ou estilo de vida que admiramos ou ao glamour em torno de uma etiqueta ou logomarca. Ok. 

Tanto esse viés simbólico quanto o apetite constante por algo novo são indícios da completa indiferença em relação às normas objetivas da vida, conforme o filósofo Georg Simmel, uma das primeiras referências de pesquisa na área, cuja obra permanece relevante. O autor alemão elucidou que a popularidade de algumas peças ou gama de cores é atingida em função de três elementos: a arbitrariedade, a distinção e a imitação. 

Foi o capricho da busca por diferenciação das classes ditas superiores que engendrou a novidade, copiada pelas classes inferiores, o que passou a induzir, de novo, as classes superiores a investirem em outra novidade e assim por diante. Segundo Simmel, esse ciclo contínuo que é a moda se instalou enfatizando o processo dialético entre a necessidade de imitar e a vontade de se diferenciar do ser humano. Esses dois elementos de modo binário - imitação/distinção - também explicam, portanto, as principais motivações de nós consumidores. 

Novos significados para o rosa do milênio

Nesse entendimento, roupas novas preenchem necessidades emocionais: se sentir diferente ou atraente, impressionar os outros ou ser aceito por amigos, conciliando a vontade de distinção com o desejo de pertencer a um grupo. Apesar dessas reflexões todas, o consumo da moda está no arbitrário, ou seja, nem sempre possui justificativas completamente racionais ou claras. Envolve nossas emoções e nossa vaidade. 

Mas e aí, será que dá pra concluir que somos vítimas da moda? Mesmo que sejamos, não considero esse fato de todo ruim sempre. As roupas têm preço, mas não tem valor a sensação boa de estar com um look novo, em um momento de alegria. 

O mais importante é que com cada vez mais acesso a informações e com tantas opções de marcas e produtos, temos a possibilidade de consumir de forma mais consciente. Como? Esse é o assunto da próxima coluna. Até lá. 

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